Forjando os Reinos – O Senhor dos Esgotos

por Ed Greenwood
Traduzido por Alexandre de Silvestre
Revisado por Daniel Bartolomei Vieira
Originalmente publicado em 12 de novembro de 2012; disponível em http://web.archive.org/web/20170121003642/http://dnd.wizards.com:80/articles/features/lord-sewers
Imagem de Destaque, “Ranger Attacks”, por Jesper Ejsing


Como, onde e quando os Reinos Esquecidos começaram? Qual é o cerne da criação de Ed Greenwood, e como o Grande Mestre dos Reinos usa seu próprio mundo quando narra aventura de D&D para os jogadores em sua campanha? “Forjando os Reinos” é uma série onde o próprio Ed Greenwood responderá todas essas perguntas, e mais.


Muitos nos Reinos já ouviram histórias sobre este ou aquele herói que matou um dragão, encontrou a Ulouth Marr (ou seja, a Joia Perdida da Maestria da Aura Mágica, para aqueles que não são sábios) ou que derrubou reinados corruptos. Porém, existem heróis do cotidiano que não são aclamados, mencionados ou que sejam vistos sobre uma perspectiva muito diferente do que aquelas feitas pelo manejo de uma espada ou com as resplandecentes virtudes dos paladinos.

Um herói subestimado é aquele que recentemente começou a receber uma atenção maior de autoridades cívicas e que teve um aumento no número de aventuras em mais do que algumas cidades no interior de Faerûn, notavelmente cidades que não possuem o luxo (caso esse seja o termo correto) de dar descarga em seus dejetos diários e mandá-los em direção ao oceano por meio de marés ou rios.

Escrevo agora sobre um gnomo quietinho, brilhante e de meia idade, conhecido amplamente pelos Reinos, porém nunca chegou a balançar uma espada ou conjurar uma magia, nem por raiva, nem por nada. Escrevo sobre Joster Barrabaixo, o Senhor dos Esgotos.

Fazendo a Caca Fluir

Um problema em qualquer centro populacional é o que fazer com os dejetos, produzidos constantemente, sejam eles de pessoas ou de animais. “Nada” não é uma opção, a não ser que o povoado fique no alto de uma montanha com ladeiras vertiginosas por todos os lados (comum em fortalezas, mas bem raro em cidades). Caso contrário, logo a cidade, literalmente, estaria enterrada em sua própria “caca” (usando um termo mais educado).

Muitos povoados cercados por fazendas pagam carroças de esterco para coletar dejetos (geralmente durante a noite ou logo cedo, pela manhã; algumas vezes, nas área mais pobres de Suzail, por exemplo, como mostrado em meu romance Elminster’s Daughter [A Filha de Elminster], um sistema de uma peça de cobre por balde recolhido) e então, fora do alcance de “um vento” da aldeia, os despejam em pilhas de estrume ou diretamente em campos de cultivo para servir de fertilizante. Poucos problemas são causados pelo estrume que está “curado” por tempo suficiente (nenhum parasita ou doença pode ser transmitida e a maioria dos indivíduos, que não estão em condições precárias de saúde, tem seus corpos “acostumados” aos vetores) porém, algumas vezes, viajantes sofrem de incomodo intestinal (chamamos no mundo real algumas vezes de “a Vingança de Montezuma”, “incômodo de viajante” ou algum eufemismo semelhante).

Água poluída com esgoto é um problema mais comum. Assim que é descoberto o caso, a água usada para limpeza e para fazer comida é fervida, e alguns fazem cervejas ou bebidas destiladas, tornando possível bebê-la.

Cidades portuárias e nas encostas de rios normalmente fazem uso das rotas mais baratas e fáceis. É usada a água que já está em movimento (rios ou marés ou ambos) para enviar os dejetos para longe. Isso pode causar problemas correnteza abaixo. Guerras no mundo real já foram travadas sobre tais circunstâncias. Considere uma cidade do interior, desconfiada de que seu suprimento de água potável está sendo poluído, dependente de um grande rio, pequenas nascentes ou poços.

Entram os gnomos. Nos Reinos, anões e pequeninos e humanos e elfos empreendedores, em raros casos, desenvolveram sistemas de esgoto em diversos de seus povoados. No entanto, os gnomos são os especialistas no assunto. Através dos séculos, o projeto, reparo e aperfeiçoamento de sistemas de esgoto das grandes e populosas cidades é gerenciado por eles. Cidadãos humanos talvez não estejam cientes que os esgotos sob seus pés é planejado, aumentado e consertado sob a supervisão de gnomos, mas quando as manilhas de esgoto entopem (melhor dizendo, “retornam” para suas casas com a força de um gêiser com resultados barulhentos), eles rapidamente adquirem um interesse em tais assuntos.

Joster Barrabaixo

É aqui que Joster Barrabaixo se destaca. Um membro de uma das três maiores famílias ou clãs gnômicos, conhecidos pela vasta experiência nos esgotos (os Barrabaixa, os Narlens e os Thallows), Joster adquiriu sua reputação no decorrer das ultimas três décadas por sua especialidade em, com sucesso, consertar, expandir e melhorar os sistemas de esgoto em Phent, Elversult, Nonthal, Elturel, Riatavin, Saradush e Secomber. Cada povoado que o contratou estava em estado critico, todavia ele obteve sucesso em cada um de seus comissionamentos. Em algum lugar distante, alguém o apelidou de “Senhor dos Esgotos”, e o apelido pegou.

Parte do sucesso de Joster se deve às melhorias feitas em bombas d’água criadas por muitos gnomos projetistas (dispositivos que movem a água e os dejetos através do sistema de esgoto; na vida real chamariamos tais engenhocas pelo termo de “Rosca de Aquimedes” ou “bomba de rosca”). Ele também é imensamente grato pelo seu próprio trabalho em aperfeiçoar as fazendas de fungos comedores de esterco. Essa última habilidade atraiu a atenção de mais do que alguns poucos aventureiros.

Fazenda de Fungos

Há muito tempo os gnomos entenderam que as plantas erva-do-pântano e grama-espada, presentes na superfície de pântanos (esteja atento, pois estes nomes são compartilhados por dezenas de plantas por toda Faerûn, e, sendo assim, aqueles que desejam duplicar os resultados de purificação de água devem encontrar as plantas corretas), assim como dezenas de fungos subterrâneos (comuns em cavernas e nas porções mais superficiais da Umbreterna) possuem a capacidade de filtrar e se alimentar de dejetos, limpando a água de toxinas e partículas carregadas pela urina e excrementos, até o ponto de torná-la potável e reutilizável.

Os mais populares (dentre os tratadores de esgoto) “fungos limpadores” em ordem descendente por abundância e uso, são:

  • O Chifrerubro. Um cogumelo alto, estreito, intensamente venenoso, de cor bordô puxando para um marrom avermelhado. Ele possui uma haste alongada e um chapéu pontiagudo, e mais se parece com um rabo de cavalo de tamanho exagerado. Ele pode crescer desde a altura do joelho até o tamanho de um humano comum, tendo a grossura de um punho humano ou pode ter mais de dois metros de altura, sendo tão largo quanto uma árvore de crepusculeira ou de um humano mais magro.
  • O Talolongo. Um cogumelo marrom-pálido que parece ser apenas um caule. Cuidadosamente equilibrado em seu topo há um chapéu enrugado de cor marrom, em vez de um chapéu em formato de domo. Ele é normalmente do tamanho de um humano, porém pode chegar a ter de três ou até mais de quatro metros quando recebe os nutrientes necessários. Seu peso tem sido um indicador para quão “sujo” está um esgoto, quando colocado em determinados locais.
  • O Addergal. Também conhecido como “arbusto-cérebro”, esse fungo lobulado e de cor ligeiramente marrom avermelhado brilhoso, lembra muito um cérebro humano gigante, com pequenos “cérebros bebês” brotando por todos os lados. Ele cresce em agrupamentos que vão até a altura da cintura de uma pessoa, e  seus nódulos podem ser rapidamente separados e replantados pelos jardineiros. O fungo exala um intenso aroma de canela quando raspado ou quebrado. Esse cheiro adocicado atrai moscas e insetos, que ficam presos em sua superfície pegajosa e são absorvidos e devorados (o fungo também é popular entre aqueles que querem livrar-se de um enxame de moscas).
  • O Sungur. Um cogumelo grande, de coloração verde esbranquiçado que possui um cheiro doce e enjoativo. Ele cresce rente ao chão e tem o caule grosso e lenhoso, mas tem um grande chapéu com formato de domo (alguns são tão grandes quanto pequenas choupanas). Emite um forte e contínuo brilho amarelo, o suficiente para que alguém consiga ler sob ele. O cogumelo também hospeda de forma simbiótica os vermes laedur. Esses lentos vermes amarronzados parecidos com lagartas escavam túneis e devoram cadáveres, matéria vegetal, excremento e tudo que não seja pedra ou metal (esses primos mais lentos da larvas-da-podridão não comem matéria viva, exceto no caso de não haver mais nada para devorar).

Para realizar a limpeza dos esgotos, esses fungos devem ser plantados nos locais adequados e em abundância. É necessário o plantio em solo contendo cascalho ou pedras soltas em boa quantidade. Terrenos argilosos não são ideais, já que o excremento não é contido por esse tipo de solo e mantém a matéria orgânica longe do ar. Também é importante que estejam situados de um modo que a água e o esgoto passem através dos fungos, evitando que montes de dejetos formem acúmulos de matéria.

Tudo é, em base, jardinagem, desde a troca do solo, plantio, drenagem de canais e todos os outros feitos que não fazemos ideia do que para que servem.

Não apenas o fungo deve ser plantado e a água drenada, mas a água potável deve ser bombeada para a superfície para que possa ser reutilizada. Em alguns casos, escravos e prisioneiros fornecem o trabalho braçal necessário para que as máquinas de bombear funcionem. No entanto, na maioria dos lugares prefere-se utilizar mulas, bois ou cavalos amarrados em cabrestos para que andem interminavelmente em círculos, girando hastes que movem cintas e polias responsáveis pelo funcionamento das bombas (bombas mais antigas consistem de pistões gigantescos, conhecidos nos Reinos como “aríete reverso”, enquanto as mais novas são roscas infinitas, popularmente conhecidas nos Reinos como “espirais-engolidoras”).

Três complicações surgiram nas fazendas de fungos, que demandaram a contratação de aventureiros para patrulhar: Invasões da Umbreterna, devido às negligentes escavações de tuneis, ou através de drenagens de corrente mais calma (que conectam as fazendas de fungos a níveis mais baixos da Umbreterna); foras-da-lei que usam sorrateiramente as fazendas de fungos para esconder tesouros, contrabando ou até vitimas de sequestro; e os gulguthra. 

Imagem da Wizards of the Coast

Gulguthra (os otyughs e otyughs jovens) amam fazendas de fungo. Eles prosperam na rica quantidade de excrementos, calor (devido ao processo de decomposição) e umidade (vinda da presença de água e urina) que os faz crescer rapidamente. Além do mais, as condições são ideais para seu crescimento. Essas criaturas produzem crias duas vezes ao ano. Normalmente, apenas um sobrevive e, cada vez mais, eventualmente dois. Isso significa que, mais ou menos, com seis meses de criação, são movidos a outros locais por equipes de aventureiros contratados por Joster. Os novos locais ficam dentro do mesmo sistema de esgoto em expansão, ou em escoadouros ou em novas fazendas de fungos.

Rumores Inquietantes

Através dos anos, aumentaram os comentários em comunidades onde o Senhor dos Esgotos trabalhou. Rumores que Joster Barrabaixo forjou pactos com guildas de ladrões, desagradáveis cabalas, cultos e organizações para que, com a permissão dele, utilizassem as cavernas com fazendas de fungos para seus seus próprios propósitos, jamais sendo incomodados. Em troca, um pagamentos regular de um “aluguel” era feito para certos coletores da família Barabaixo.

Embora isso seja uma realidade em Phent, não há comprovações de que Joster tenha envolvimento ou conhecimento sobre tais práticas.

Recentemente, tem havido conversas sobre o Senhor dos Esgotos estar trabalhando com dúplices, e até mesmo com observadores, em várias atividades controvérsias em esconderijos subterrâneos. Existem guildas locais que se opõem a contratar os serviços de Joster em seus “gramados”, e (como Elminster colocou há algum tempo): “Rumores são armas sacadas facilmente pelos covardes”.

A verdade sobre Joster Barrabaixo ainda é desconhecida. Qualquer DM pode utilizar isso como bem entender, é claro, dentro de sua própria campanha nos Reinos. Jogadores são, afinal, sempre inventivos.

Ensopado de gulguthra, alguém quer?


Para ver outros artigos da série Forjando os Reinos, clique AQUI.


Ed Greenwood é o homem que lançou o cenário de Forgotten Realms, os Reinos Esquecidos, em um mundo vivo. Ele trabalha em bibliotecas, e escreve histórias sobre fantasia, ciência, ficção, terror, mistério e romance (algumas vezes tudo isso em um mesmo livro), mas fica feliz quando produz Conhecimento dos Reinos, Conhecimento dos Reinos e mais Conhecimento dos Reinos. Ele ainda tem algum espaço vago em quartos de sua casa, usados para empilhar papéis.


Agora temos material de D&D em português. Não perca a chance e adquira seus livros do jogo de RPG mais popular do mundo!

Você pode gostar...

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *

%d blogueiros gostam disto: