Como Interpretar um Oni Digno de Pesadelos
por James Haeck
Originalmente publicado em 09 de maio de 2018, disponível em https://www.dndbeyond.com/posts/223-how-to-play-an-oni-like-a-living-nightmare
traduzido por Sandro Albertini; revisado por Daniel Bartolomei Vieira
Arte destacada, imagem da Wizards of the Coast
Um pequenino paladino sentou-se na cama, olhando para a charneca através de uma janela velha e empoeirada. Manteve sua espada junto à cama nesta noite, como fizera nas últimas três noites na velha mansão, apesar de seus três companheiros de viagem estarem noutras camas próximas. Passava da meia-noite, mas ainda assim ele continuava acordado, olhando apreensivamente pela janela.
Movimentou-se bruscamente sob os lençóis e voltou sua cabeça em direção à porta do quarto que dividia com os companheiros. A porta se abriu com um longo rangido. Seu peito apertou e o pulso acelerou. Agarrou sua espada. Sentia o couro frio ao redor do pomo do punho da arma enquanto olhava fixamente para a escuridão do corredor adiante. Enquanto preparava-se para o terror desconhecido que sabia se esconder naquela casa velha, uma memória de infância surgiu em sua mente. Uma cantiga infantil. Das mais sinistras, do tipo que os pais cantam para assustar os filhos para se comportarem. Sem pensar, cantou as palavras em um fôlego.
Tranque a porta, sopre a vela;
O oni faminto, a noite gela.
Ficou de pé e o frio do chão subiu por seus pés descalços. Lançou-se em direção à porta, passando pelo humano mago adormecido, pelo elfo bárbaro em transe profundo, e pelo ressonante pequenino clérigo, seu amigo da velha pátria. Parou no limiar do corredor escuro e olhou para o abismo.
Esconda-se e trema, pequeno irmão;
O oni quer você para diversão.
Seu punho na lâmina apertou-se até os nós dos dedos ficarem brancos e a sua pequena mão tremeu. Respirou fundo e mergulhou no corredor. Apenas o brilho fraco do luar através das janelas iluminava seu caminho. Alcançou os conjuntos de armadura alinhados no corredor e lançou sombras espectrais nas paredes.
Ouça-o a porta arranhar;
No chão, sua sombra lançar.
Parou mortificado no meio do corredor, e o medo e a compreensão nascente apertaram seu coração. Voltou para a porta de seu quarto, rogando à Yondalla para não ver o que achava que veria. A porta, ligeiramente aberta, tinha marcas profundas de garras. No interior, uma longa sombra atravessava o chão em direção às camas de seus amigos. E enquanto corria de volta ao quarto, ele percebeu: em nenhum momento era ele a cantar.
O sol não vai nascer por um bocado;
Até lá, com o sorriso do oni, cuidado.
Há poucas criaturas em Dungeons & Dragons tão criminalmente subestimadas como os oni. É um dos monstros mais antigos de D&D, aparecendo pela primeira vez como o “ogro mago” no Supplement 1: Greyhawk (de 1975) junto do observador e do devorador de mentes. O oni é o monstro favorito do designer de D&D Mike Mearls, e é uma criatura que une, com sucesso, jogabilidade interessante e narrativa envolvente. Ele merece um lugar no hall da fama de D&D, assim como seus contemporâneos mais lembrados, e merece um lugar em seu jogo, porque, quando bem interpretado, pode ser a estrela de uma sessão que seus jogadores vão falar por anos vindouros.
O Oni de “D&D”
Um oni é uma criatura do folclore japonês mas, como todas as criaturas mitológicas que o D&D toma emprestado, o oni do Monster Manual: Livro dos Monstros tem apenas uma semelhança passageira com o seu equivalente japonês. Vamos discutir como tornar o seu oni mais parecido com o que aparece nas lendas japonesas, discutido posteriormente neste artigo. Vale a pena notar, no entanto, que mesmo na primeira aparição do oni como o “ogro mago” no Supplement 1: Greyhawk, ele foi especificamente chamado de ogro japonês, observando que “[Ogros Magos] são ogros devidamente japoneses, muito mais poderosos do que seus primos ocidentais!”.
Hoje em dia, o oni foi reformulado como um bicho-papão que adora se alimentar de crianças humanas. Eles usam magia das trevas para se disfarçarem como humanoides ou gigantes de modo a perseguirem as presas, e então atacam à noite. Já não são grandes xamãs da espécie ogro, são agora apenas parentes distantes dos verdadeiros ogros. Esta mudança de classificação pode ser desagradável para aqueles que cresceram amando o ogro mago (Mike Mearls, muitas vezes, acidentalmente chama o oni de ogro mago em entrevistas), mas faz todo o sentido para os novatos em D&D, e até mesmo aos novatos em ogros magos em geral. Mas isso porque interpretar um oni não é o mesmo que interpretar um ogro.
Em Combate: Oni, Terror Noturno
O oni pode ser um monstro do tipo Gigante, mas exceto pelo tamanho e poderes de regeneração similar ao dos trolls, eles não são nada como os outros gigantes no Monster Manual: Livro dos Monstros. Os oni não lutam como ogros, usando força bruta para matar os seres menores. São criaturas horrendas que atraem outros seres para uma teia de engodos arcanos, apenas para atacar das sombras quando a presa está mais fraca. Os oni são excelentes monstros para um DM deixar guardado no bolso como um recurso, pois a mistura impressionante de magia e poder bruto fazem deles um inimigo versátil para quase qualquer ocasião.
Os detalhes de história no Monster Manual: Livro dos Monstros sugerem que os oni são solitários, ou pelo menos agem como assassinos solitários para mestres que prometem a eles, como pagamento, poder mágico. Eles raramente lutam de forma justa, preferindo utilizar a magia para esconderem-se nas sombras como espectros e enfraquecer os inimigos através do medo e de táticas psicológicas antes de atacarem. Se você fizer uso da magia dos oni de modo eficaz, pode ser capaz de enganar seus jogadores com um ataque surpresa, e então escapar sem levar um golpe sequer. Um oni pode enfrentar inimigos acima da categoria dele e trazer ruína a um grupo despreparado. Se os seus jogadores odeiam sentir-se impotentes, você deveria esperar até que seus aventureiros estejam ao menos, no 7º nível antes de confrontá-los com um oni. Mas se eles apreciam a emoção eletrizante de serem perseguidos como adolescentes em um filme de terror, o oni é perfeito para este trabalho. As características de combate que ele tem são perfeitos para a tradição assustadora que carrega.
As Características do Oni
Cerca de metade das características do oni estão focadas em permitir que ele ataque de surpresa, e de qualquer ângulo — e, em seguida, escapar para lutar outro dia. A outra metade está voltada para o abate total das vítimas naqueles preciosos segundos que tem antes de fugir, invisível, para a noite.
Defesas. A julgar pelas diretrizes de construção de monstros no Dungeons Master’s Guide: Livro do Mestre, as defesas do oni são medíocres, porém funcionais. Ele pode durar por um ou dois turnos em uma luta direta graças a sua classe de armadura ligeiramente acima da média, mas não tem os pontos de vida para sobreviver a uma pancadaria mais duradoura. Sua habilidade se Regeneração melhora um pouco sua chance de sobrevivência, embora só dê ao oni cerca de 20-30 pontos de vida adicionais em um encontro de combate mediano.
Movimento. O deslocamento de voo de 9 metros do oni é uma ferramenta incrivelmente poderosa, especialmente por ele poder conjurar invisibilidade à vontade (o fato dele possuir um deslocamento de voo inato é importante, uma vez que tanto voo quanto invisibilidade requerem concentração). Um oni invisível e voador pode mover-se impunemente. Se a invisibilidade não for suficiente, o oni pode também conjurar forma gasosa uma vez ao dia. Esta magia pode ser usada como uma forma de infiltrar-se em um recinto bem guardado, passando por baixo de portas fechadas ou janelas obstruídas, mas é mais útil como um botão de pânico que o oni pode usar para recuar em circunstâncias desfavoráveis. Essa habilidade não o torna imune a todos os danos e reduz o deslocamento de voo para 3 metros, então você deve estar atento para usar uma ação para conjurá-la antes da luta ficar desfavorável.
Subterfúgio. Um oni pode usar a habilidade de Alterar Forma para metamorfosear-se em um humanoide Pequeno ou Médio ou qualquer gigante Grande —t ais como um ogro, um ciclope ou um troll. Imagine a surpresa dos jogadores quando o pequenino que eles pensavam ser seu amigo acaba por ser um enorme oni!
Conjuração Inata. O poder de um oni é, em grande parte, derivado de suas magias. Ele pode conjurar invisibilidade e escuridão à vontade, mas tenha em mente que não pode conjurar ambas ao mesmo tempo, pois ambas requerem concentração. Uma vez que invisibilidade é uma magia defensiva superior na maioria das situações, um oni deve usar escuridão de modo ofensivo para cegar oponentes. A principal vantagem defensiva de escuridão sobre invisibilidade é que a escuridão persiste depois de atacar ou conjurar uma magia, enquanto invisibilidade termina imediatamente após atacar ou conjurar. Mesmo podendo conjurar à vontade, uma rodada de visibilidade pode ser suficiente para o grupo cair matando sobre o oni e despedaçá-lo.
Um oni tem quatro magias que pode usar uma vez por dia cada: cone de frio, enfeitiçar pessoa, forma gasosa e sono. Cone de frio é sua magia mais potente e um oni sempre deveria começar seu ataque conjurando cone de frio ainda furtivo, se puder atingir todo o grupo na explosão — e o alcance de 18 metros significa que um oni pode usá-lo mesmo voando longe do alcance dos combatentes corpo a corpo. Enfeitiçar pessoa pode ser útil em situações sociais, especialmente quando o oni tiver assumido outra forma através de sua característica Alterar Forma. Sono é, geralmente, fraca demais para ser uma magia efetiva, mas conjurá-la logo após envolver o grupo todo em um cone de frio pode ser mortal.
Ataques Físicos. Um dos indícios de um oni é a terrível glaive que ele carrega. Cuidado com pequeninos amáveis empunhando glaives terríveis. Os ataques físicos de um oni são bastante fracos em comparação com outros monstros de ND 7, e só devem ser usados depois de seus alvos terem sido enfraquecidos por um cone de frio. Você deve ser cuidadoso; nenhum oni que se preze deve ser pego em luta corporal por muito tempo. Bata rápido, use a glaive para dar um ou outro golpe final se necessário e, em seguida, fuja.
As armas físicas de um oni são mágicas, então você pode superar a resistência a armas não mágicas, o que ajuda um pouco.
As Táticas de um Oni
A primeira regra dos filmes de terror é que um mostro é sempre menos assustador depois que você o vê. O oni quer botar medo no coração de suas vítimas estando invisível e intangível. Felizmente, ao contrário de um devorador de mentes, o oni ainda tem alguma resistência após abandonar seu esconderijo.
Um oni raramente quer atacar de surpresa total. Seu modus operandi é perseguir a presa como um assassino de filmes de terror, provocando-os de longe para que seus alvos sejam tirados do jogo. Talvez o oni faça sua presença conhecida no início de uma masmorra, apareça em cada luta dentro dessa masmorra, faça alguns ataques fracos e, então, fique invisível e esconda-se ao ser reduzido a cerca de metade de seus pontos de vida máximos. Qualquer ferimento incidental estará totalmente curado através de sua característica de Regeneração antes da próxima luta. Após atormentar desse modo por toda a masmorra, os personagens precisam, ao final, encarar o oni como chefe, ainda em pleno poder.
Se os personagens em algum momento decidirem que basta e conjurarem dissipar magia para descartar a invisibilidade do oni, ele, então, ataca com toda a força, conjurando cone de frio para aniquilar tantos inimigos quanto possível em um único golpe.
DMs realmente cruéis podem usar o oni para interromper os descansos curtos e longos de um grupo, evitando que se recuperem enquanto estiverem na masmorra. Isso pode ser muito difícil para DMs com novos jogadores, mas se você sabe com o que seus jogadores podem lidar, isso mostrará que nenhum lugar é seguro enquanto estiverem sendo perseguidos por um oni.
As suas táticas podem variar com base nas necessidades da sua campanha, mas uma rotação tática eficaz e poderosa para um oni é:
- Permaneça na forma oni enquanto luta, a menos que você tenha uma boa razão para não o fazer; seu tamanho Grande melhora o dano causado por sua glaive.
- Inicie o combate aéreo e não pare, a menos que seja absolutamente necessário. Sempre termine seu turno a ao menos 6 metros acima do chão. Felizmente, o alcance de 3 metros de sua glaive provavelmente evitará que provoque um ataque de oportunidade ao se retirar após um ataque corpo a corpo.
- Comece o combate invisível. Se, por qualquer motivo, sua invisibilidade acabar, você pode tentar enganar seus inimigos movendo-se 3 metros em uma direção, conjurando invisibilidade e então movendo-se 6 metros em outra direção. Os personagens podem sempre atacar criaturas invisíveis com desvantagem, mas ao atacar um espaço que não contém uma criatura, eles não têm chance alguma de acertar!
- Se você estiver apenas importunando o grupo e planeja fugir, ataque com a sua glaive a 3 metros de distância enquanto invisível e, então, fuja. Fique invisível usando sua ação no seu próximo turno, e repita até ter cerca de metade de seus pontos de vida máximos, então escape enquanto invisível.
- Se você for forçado a uma situação de vida ou morte, comece o combate atingindo todo o grupo com cone de frio, usando seu voo para obter um bom ângulo. Se você acredita que o grupo está severamente ferido, conjure sono em sequência no seu próximo turno. Fique invisível o máximo possível.
- Se você for reduzido a 1/4 de seus pontos de vida máximos e puder escapar através de uma pequena fenda, use forma gasosa para tentar escapar e viver para lutar outro dia.
Oni Alternativo
Este artigo não estaria completo sem alguma discussão sobre o verdadeiro oni japonês, bem como algumas maneiras de tornar o oni do Monster Manual: Livro dos Monstros uma ameaça ainda mais séria.
Os poderes de um oni em D&D são razoavelmente fiéis ao oni do folclore japonês. Os oni japoneses são espíritos malignos que se manifestam como ogros monstruosos. Eles não são necessariamente maus, mas são tipicamente cruéis e ameaçadores. Tradicionalmente, os oni não empunham uma glaive (naginata), mas empunham uma clava de ferro conhecida como kanabō. Seria perfeitamente aceitável substituir a glaive do oni de D&D por uma clava grande, como a clava grande kanabo que criei para a série Beyond Damage Dice da Kobold Press.
Uma estranha inconsistência nas estatísticas do oni, conforme apresentado no Monster Manual: Livro dos Monstros, é que ele veste cota de malha. Sua arte não o retrata com cota de malha, mas isso cria um problema mais significante do que a arte inconsistente. Quando um oni usa a habilidade de Alterar Forma, “o único equipamento que é transformado é sua glaive, que encolhe para que possa ser usada na forma humanoide”. Se as regras forem seguidas estritamente aqui, a sua cota de malha não é afetada por essa habilidade, deixando-o indefeso depois de mudar de forma. Uma regra da casa simples para resolver esse problema é simplesmente considerá-lo com “Classe de Armadura 16 (armadura natural)”, resolvendo tanto a arte incompatível quanto a problemática regra.
Já que os oni são planejados para serem perseguidores furtivos, independentemente do tamanho que têm, eu também daria a perícia Furtividade em vez de Percepção, concedendo-lhe um bônus de +3 em teste de Destreza (Furtividade).
Se você quiser tornar o seu oni mais poderoso, lembre-se que eles estão sempre em busca de novos itens mágicos. De acordo com o Monster Manual: Livro dos Monstros, “Um oni serve a um mestre se isso provar-se lucrativo ou provê-lo com um lar luxuoso e bem defendido. Os oni cobiçam magia, e trabalham para magos malignos e megeras em troca de itens mágicos úteis”. Um oni com um item mágico que o permita atacar à distância, à vontade, como uma varinha de mísseis mágicos, torna-se um inimigo ainda mais perigoso. Um manto de deslocamento também é adequado e concede maior resistência em combate.
Diversão ao Interpretar um Oni
D&D sempre é sobre se divertir e, como DM, você tem a tarefa desafiadora de ajudar seus jogadores a desfrutar do jogo enquanto também se diverte. Alguns jogadores apreciam jogos de terror ou suspense, e vão adorar a emoção de serem perseguidos por um oni. Outros vão se estressar com isso ou apenas aborrecerem-se ao tentarem lutar contra um inimigo evasivo. Preste atenção aos sinais que seus jogadores enviam a você e esteja preparado para maneirar em jogos futuros se eles tiverem um mau momento. Provavelmente é melhor não lançar esse tipo de jogo para jogadores iniciantes, a menos que todos na mesa sejam grandes fãs de terror.
Tente encontrar o equilíbrio certo entre estresse e excitação. Será necessário prática, então não espere acertar na primeira vez. Boa sorte e tenha pesadelos felizes!
James Haeck é o escritor chefe em D&D Beyond, co-autor de Critical Role: Tal’Dorei Campaign Setting e escreve como um freelancer para Wizards of the Coast, D&D Adventurers League e Kobold Press. Ele vive em Seattle, Washington, com sua parceira Hannah e seus dois demônios errantes, Mei e Marzipan. Você normalmente pode encontrá-lo perdendo tempo no Twitter em @jamesjhaeck.
Oni*
Adorei a ideia de se trabalhar alguns monstros em destaque. Essa do Ônibus ficou ótima.