As Aventuras de Volo – Tesouros Perdidos de Cormyr, Parte 3
Originalmente publicado na Dragon Magazine nº 280 (fevereiro de 2.001)
por Ed Greenwood
traduzido por Daniel Bartolomei Vieira
Imagem destacada, “Treasure” por Poulami Mukhopadhyay (disponível em https://www.artstation.com/artwork/LNv5l)
Volothamp Geddarm, ao vosso serviço, cavalheiros, definindo as verdades sobre Faerûn diante de vossas senhorias como moedas sendo lançadas como uma chuva dourada sobre os ombros de um anão trabalhando com o martelo, estampando moedas feitas de ouro macio. No dia de hoje vos escrevo a respeito de outro par de contos de tesouro recolhidos dos registros do grande reino de Cormyr.
A Harpa da Cura
Debates ainda enfurecem os círculos de estudiosos em Cormyr a respeito se o Reino Florestal perdeu, no passado, uma grande magia na forma de harpa que tinha a capacidade de curar aqueles que a tocavam enquanto esta tocava sozinha, ou se, por pouco, se libertou de um grande mal.
Aubleth Coroa-Argenta
(de 989 CV até 1.066 CV)
Um herói dos cavaleiros de Cormyr, sempre sorridente e de coração valente, Aubleth foi, durante alguns anos, o membro mais jovem da elite da Guarda Grifo do Rei Arangor (uma ordem de cavaleiros que montavam grifos e que agiam como olhos, enviados e comandantes de batalha para o rei). A lança que ele usava, posteriormente, o ajudou a reivindicar a vida de Thauglor[1], o último grande dragão a caçar nas terras de Cormyr.
Aubleth estava sempre barbeado, tinha os cabelos loiros, ombros largos, tinha tendência a engordar e os olhos eram de um tom acastanhado, âmbar. Ele era um amigo próximo de Gardrath Chifre-Berrante; dos dois, Aubleth era o mais brincalhão e o mais esperto.
Gardrath Chifre-Berrante
(de 984 CV até 1.019 CV)
Um cavaleiro alto e esguio da Guarda Grifo, Gardrath ajudou a matar o dragão Thauglor, junto do amigo Aubleth. Ele tinha um comportamento deveras nobre e era um homem carregado de sentimentos. Tinha cabelos negros e olhos azuis penetrantes que assumiam uma tonalidade mais escura quando ele estava furioso, ou apaixonado.
O valoroso serviço de Gardrath elevou a família dele (o clã era considerado nobre em Águas Profundas[2]) até a posição de nobreza de Cormyr. Ele ainda é lembrado nas lenda pelos alojamentos dos Dragões Púrpura pela morte corajosa que teve: Quando uma febre terrível o lançou para o leito de morte durante um longo inverno, ele vestiu as melhores botas que tinha, pegou a melhor espada e saiu para caçar lobos. Ele foi encontrado morto na manhã seguinte sob os corpos de seis destas feras.
Lareth Caça-Prata
(de 984 CV até 1.019 CV)
Um esbelto e sarcástico espadachim da corte, Lareth fez amizade com Halartan Esporão-de-Wyvern logo que chegou ao reino. Quando eles iam beber juntos, as observações divertidas de Lareth frequentemente deixavam Halartan cuspindo e bufando as bebidas pelo nariz.
Lareth tinha os cabelos loiro acinzentados e um bigode fino, era jovial e tinha jeito com as damas da corte, tendo romances com várias ao mesmo tempo.
Ele terminou os últimos dias de vida casado e feliz com a filha de um estalajadeiro de origem do povo, chamada Roatha Ildraen, e como o Senescal do antigo forte de beira estrada, agora desaparecido, Virapedra[3].
Aiken Esporão-de-Wyvern
(de 1.008 CV até 1.082 CV)
O filho do Lorde Gerrin Esporão-de-Wyvern, Aiken tinha cabelos e olhos castanho escuros. Era magro e baixo, de uma natureza quieta e leal. Um astuto investidor e construtor, Aiken solidificou as fortunas da família ao construir casas e lojas por toda a capital Suzail.
A Harpa Que Tocava Sozinha
Em uma estalagem de beira de estrada ao norte de Suzail, não muito tempo após a morte do grande dragão Thauglor, quatro homens andando de volta para casa após uma noite de comemorações, testemunharam uma cena estranha e misteriosa: em uma clareira ali perto fora da estrada, um brilho pouco mais suave do que o de uma fogueira resplandeceu. Olhando melhor, eles notaram que o brilho vinha de uma harpa que flutuava e cujas cordas se moviam como se tivessem sendo tocadas por mãos invisíveis. Em seguida, plebeus doentes e mutilados começaram a se rastejar por entre as árvores até a harpa para tocá-la, pois ao fazer isso todo o mal que os afligia ia embora e eles ficavam curados. Subitamente vigorosos e fortificados, eles jogavam fora muletas e xales, riam e gritavam de alegria e corriam para dentro da floresta.
Os quatro homens na estrada que descobriram primeiro a harpa eram todos cortesãos: Aubleth Coroa-Argenta, Lareth Caça-Prata, Gardrath Chifre-Berrante e Aiken Esporão-de-Wyvern. Não eram homens dados a mentiras, nem eram homens que exageravam na bebida.
Os plebeus pareciam sair das árvores e correr de volta para elas, e isso pareceu muito suspeito aos quatro – assim como a própria existência da harpa, desconhecida e, ainda assim, a uma pequena caminhada das muralhas de Suzail. O serviços dos cortesãos lhes pareceu claro: tal magia deveria ser investigada e dada à custódia da coroa. Os quatro, então, entraram na clareira e pegaram a harpa – e foi quando os plebeus que estavam por ali sumiram como fumaça, tando os fracos quanto os revigorados, e a harpa passou a ficar silenciosa e apagada nas mãos dos quatro.
Eles levaram a harpa diretamente para a Corte Real e a apresentaram ao mago de guerra que estava de serviço. Nos dias que se seguiram, uma grande quantidade de magia foi conjurada sobre eles e sobre a harpa, na tentativa de descobrir a verdade sobre a origem e poderes dela.
As conclusões foram as seguintes: por razões desconhecidas, a harpa caía em silêncio e permanecia assim até que qualquer dos quatro estivesse a pelo menos seis passos dela e, caso contrário, esta brilhava, levitava até a altura do peito de um homem (da mesma forma como foi vista pela primeira vez) e tocava melodias que ninguém em Suzail poderia identificar a origem.
Aqueles que a tocavam mencionavam uma sensação acalentadora e o banimento de qualquer tipo de dor que por ventura estavam sofrendo – mas diferente dos plebeus que foram vistos pelos quatro, ferimentos e outras aflições não desapareciam dos corpos de tais pessoas e as dores logo retornavam
Um dos magos de guerra da época, Thamaeler Mornalar, suspeitou que a harpa conjurava magias nas mentes daqueles que a tocavam diretamente (ou seja, a tocavam com a pele) enquanto esta estava tocando – magias essas que pareciam dormentes, mas que permaneciam nas mentes deles.
Quando outras magias eram conjuradas para dissipar e banir todas as magias daqueles que haviam tocado a harpa, muitos destes reagiam com uma raiva momentânea e com breves, porém histéricos ataques contra pessoas ao redor. Esse frenesi acabava assim que a dissipação mágica fazia efeito.
Aubleth Coroa-Argenta havia estado sonâmbulo antes do aparecimento da harpa, mas em uma noite alguns meses depois que ele ajudou a trazê-la para Suzail, ele irrompeu pela sala onde ela era mantida, golpeando despropositadamente dois guardas e um mago de guerra enquanto este estava dormindo, e tentou quebrar a harpa com as próprias mãos.
A harpa começou a ressoar descontroladamente por toda a Corte Real, alcançando distâncias impossíveis e despertando muitos. Guardas e magos de guerra invadiram a câmara e se depararam co uma aparição translúcida de uma humana trajando um manto – presumivelmente uma feiticeira, de semblante pleno, mas com olhos intensos e inflamados – em pé, flutuando sobre a harpa. Estalos elétricos saíam das mãos dela, parecendo simultaneamente juntar os pedaços da harpa despedaçada e drenar a vida do contorcido Aubleth. Quando magias rapidamente conjuradas interromperam o processo, a aparição os encarou e, então, desapareceu – levando consigo a harpa.
A mulher não foi vista novamente, mas a harpa apareceu em muitos locais por toda a Cormyr ao longo daquela mesma noite, brilhando para a existência enquanto tocava auto seus tons e desaparecia tão rapidamente quanto surgiu. A música da harpa despertou muitos daqueles que a haviam tocado previamente, fazendo com que levantassem das camas e atacassem outros, fossem até cavalos selados, andassem obstinadamente até determinados locais, e assim por diante. Pessoas afetadas logo pararam de fazer o que estavam fazendo, e aqueles enfeitiçados não tinham conhecimento de porque estavam agindo de tal maneira, ou como chegaram até os locais onde estavam.
O enfraquecido e desorientado Aubleth Coroa-Argenta recuperou a saúde completamente com o passar do tempo, mas ela jamais conseguiu se lembrar que quaisquer das ações que tomou ou quaisquer outros eventos que aconteceram naquela noite.
A Harpa da Cura tem sido, de acordo com contos de taverna e de beira de fogueira de acampamento, vista de tempos em tempos por toda Cormyr desde então, embora os avistamentos mais recentes tenham sido menos recorrentes e separados entre décadas e décadas, às vezes até saltando gerações inteiras. Muitas pessoas dizem que a harpa é um sinal do favor dos deuses para com o reino de Cormyr, uma esperança para os feridos e os aflitos pelo reino.
Thamaeler tinha, em vez disso, conclusões mais sombrias e insistiu que esses pensamentos fossem registrados tanto nos arquivos da corte quanto nos anais da Irmandade dos Magos de Guerra. Ele sentia que a harpa era um dispositivo usado por um poderoso mago ou qualquer outro arcano desconhecido para trazer as mentes de muitos cormyreanos para os domínio do controle mágico dele, possivelmente para algum propósito futuro de ação hostil para com o reino, ou ao menos para afetar a regência dos Obarskyrs.
Alguns magos de guerra acreditam que a tal aparição de feiticeira seja de origem thayana, enquanto outros acreditam que ela serve uma família nobre exilada, ao Culto do Dragão, aos Zhentarim ou a alguma conspiração sembiana; todas essas crenças, se bem lembrado, são apenas especulações.
A maioria das pessoas comuns de Cormyr acreditam que a Harpa da Cura é uma coisa boa que foi enviada pelos deuses e que a coroa tentou pegá-la para si – mas pela graça dos deuses que a enviaram, esta conseguiu escapar, para vagar por Cormyr por conta própria.
Até os dias de hoje, pregadores de peça, bandidos e ladinos frequentemente tocam harpas no meio da noite para tentar atrair pessoas para a floresta. Tal música acaba deixando magos de guerra e os Dragões Púrpura completamente de alerta. Provavelmente eles lidarão menos gentilmente com tais harpistas se estes acabarem sendo pegos.
O Fantasma Pedra-Negra
Estes mesmos quatro amigos se envolveram em outro tipo de tesouro perdido logo após os eventos do encontro com a Harpa da Cura: a mansão assombrada de Pedra-Negra e o desaparecimento das pessoas que moravam lá, bem como todo o tesouro.
Pedra-Negra ficava na margem oeste do Rio Água-Estrela, sobre um penhasco alto e pedregoso, no lado interno onde o rio fazia uma curva para se virar em direção ao mar. Este mesmo penhasco é visível até os dias de hoje, mas exceto isso é uma colina vazia, exceto por algumas ovelhas pastando e uma pequena torre de vigília dos Dragões Púrpura.
Naqueles dias, um bosque denso cobria o local, e Pedra-Negra – hoje apenas um punhado de pedras tombadas cobertas por arbustos, onde a mansão desabou por sobre os porões – erguia-se como uma mão negra cheia de dedos entre as árvores.
Pedra-Negra era a morada dos Theresparin, uma família de tecelões e proprietários de terras que ascendeu rapidamente, e que era conhecida pelos compatriotas cormyreanos pelos vastos rebanhos de ovelhas.
Então, chegou o dia que o inquieto e detalhista líder da casa, Naronder Theresparin, falhou em comparecer em uma reunião esperadíssima na presença dos oficiais da corte. Então, outras reuniões foram perdidas até que chegou a notícia às autoridades e vizinhos que os Theresparin – e todos os empregados deles – já não eram vistos há alguns dias.
Tendo em mente a experiência que tiveram com a Harpa (e com as consequências do evento, onde a cooperação deles entre si surpreendeu), o rei enviou Aubleth Coroa-Argenta, Lareth Caça-Prata, Gardrath Chifre-Berrante e Aiken Esporão-de-Wyvern para investigar o fato.
Eles encontraram Pedra-Negra completamente vazia – despojada até as paredes, sem vivalma. O único sinal de morte foi uma enorme mancha de sangue, como daquelas que só poderiam ter sido deixadas por uma vida humana, ou de algum número de criaturas grandes, que se esvai. A mancha cobria a maior parte do piso do grande salão de festas ladeado por sacadas.
Os quatro cortesãos exploraram Pedra-Negra de uma ponta a outra, até mesmo nos drenos, porões e telhados (assassinos, naqueles dias, haviam começado a colocar os corpos nos telhados para que as aves carniceiras e o tempo se livrassem deles), mas não encontraram mais nada. Dois deles ficaram de guarda enquanto os outros dois foram buscar um mago de guerra para tentar vasculhar magicamente aquele local vazio.
Estes, também, não encontraram nada. Os Theresparin, os servos e todos os móveis e riquezas[4] da casa – até mesmo os cavalos e a comida deles nos estábulos – haviam desaparecido, jamais vistos novamente.
Até os dias de hoje, ninguém soube mais nada sobre eles, pois no começo se pensava que eles estavam morando em algum lugar próximo, mas com o passar do tempo, logo a história da família Theresparin foi desaparecendo e caiu no esquecimento das coisas que ficam no passado.
Boatos sobre Pedra-Negra ser um local assombrado acabou nascendo por causa do que se sucedeu com os quatro cortesão logo após o primeiro dia de busca deles. Eles haviam decidido permanecer na casa e dormir por lá fazendo turnos de vigia, suspeitando que bandidos escondidos nos bosques poderiam ter saqueado a casa – e poderiam agora retornar para procurar pelas paredes por passagens secretas e coisas do tipo, talvez após torturar um dos residentes atrás de informações mais detalhadas sobre o paradeiro de locais secretos espalhados pelo local.
Nenhum bandido apareceu, mas os quatro cortesão ouviram a voz trêmula de uma mulher sussurrando próximo dos ouvidos deles. Nenhuma pessoa visível era o orador. Eles passaram as lâminas que portavam por onde deveria haver a pessoa que lhes falava, mas nada surgiu ou aconteceu. A tal voz dizia coisas como “Todos, todos se foram”, e “Isso é coisa dos elfos, sem dúvida alguma”.
Lareth Caça-Prata ouviu, mas somente ele, uma voz masculina também, que falava fria, porém sonhadoramente: “O sangue os chamou. Não há como escapar”, e depois mais tarde, “Cuidado com a espada que se transforma em pégaso. Ela, que a carrega, pode romper os portões”.
Quem eram esse oradores fantasmagóricos, e o que eles estavam querendo dizer com isso, permanece até hoje como meras conjecturas – durante duas noites após os quatro ouvirem tais vozes (e uma noite após os magos de guerra vasculharem Pedra-Negra inteira, até onde eles a conheciam), a mansão pegou fogo e queimou como uma tocha, mesmo sendo feita de pedras por dentro e por fora, queimando tudo com um calor tão intenso que quase derreteu as paredes. Logo depois pela manhã, a mansão desabou até o estado que permanece até hoje – e anos depois foi reclamada pela coroas, que esperava pelo retorno dos desaparecidos Theresparin.
Notas de Rodapé de Elminster
[1] O nome completo, da forma como os dragões gostam de colocar tais coisas, “Thauglorimorgorus, a Destruição Negra”. Sobre o tolo comentário de Volo sobre este ter sido “o último grande dragão a caçar nas terras de Cormyr”, saibam vocês que tais palavras são um chamariz, como trombetas soando para convocar dragões de todos os lugares a vir para o belo Reino Florestal, furiosos, apenas para provar que Volo está enganado – como se tal prova fosse realmente necessária.
[2] Isto é uma verdade, embora as relações de sangue parecem – se é que eram – qualquer medida de causa comum, como lealdade, aparência ou comportamento. Os Chifre-Berrantes em ambos os locais eram conhecidos por uma ousadia enérgica, alguém poderia dizer; outros a denominavam “inconsequente”, “impetuosamente desnecessária” e coisa pior. Tenha em mente que não se confunda os Chifre-Berrante com os Soa-Trombeta; muitos duelos já começaram por causa disso.
[3] Virapedra, saibam vocês, ficava no lado leste do Caminho Calantar, ao norte de Mar Imerso. Lareth fez uma fortuna e uma reputação para si próprio ao criar ágeis e belos cavalos lá, e os vendia para todos que passavam por lá – eu inclusive. Ele tinha três filhas pequenas, três fadinhas fogueteiras e arteiras, me recordo muito bem; elas jogaram maçãs em mim por diversão, então eu criei três esferas de água a partir do bebedouro dos cavalo, cada uma para molhar aquelas três pequenas cabecinhas loiras. Guardei essas memórias, vejam bem, mesmo depois de tanto tempo; essas lembranças são tudo o que resta daquelas três garotas agora.
[4] Estas estavam estimadas pelo escriba-contador deles, na época, em uma quantia de cerca de 80.000 moedas de ouro, além de várias vezes essa quantia em gemas e barras comerciais, escondidas ou estocadas em uma dúzia de locais conhecidos deles.