Forjando os Reinos – As Quatro Missões do Esplendor
por Ed Greenwood
Traduzido por Sandro Albertini
Revisado por Daniel Bartolomei Vieira
Originalmente publicado em 19 de novembro de 2012; disponível em https://dnd.wizards.com/articles/features/four-quests-radiance
Imagem de Destaque, “Ranger Attacks”, por Jesper Ejsing
Como, onde e quando os Reinos Esquecidos começaram? Qual é o cerne da criação de Ed Greenwood, e como o Grande Mestre dos Reinos usa seu próprio mundo quando narra aventura de D&D para os jogadores em sua campanha? “Forjando os Reinos” é uma série onde o próprio Ed Greenwood responderá todas essas perguntas, e mais.
Os sacerdócios de Faerun estão em constante renovação. Com o passar do tempo, mudam as características e atitudes dos deuses. A influência deles sobre os mortais aumenta ou diminui, e o poder e interesse secular de suas igrejas se transforma.
No entanto, até o momento, ao longo dos anos de publicação dos Reinos, quando os avatares das deidades não estão no palco, quando cismas não estão em erupção; enquanto o mundo não está sacudindo ou pendurado na balança, os debates e feitos por baixo dos panos do clero têm sido, de certo modo, negligenciados.
Então aqui segue um exemplo de algo que está ocorrendo quase que constantemente, de várias formas, entre as crenças organizadas dos Reinos. Eu escolhi a Igreja de Tymora, porque esta é de interesse de todos os aventureiros (os quais são, afinal, a maioria dos jogadores), e porque a natureza dinâmica de uma deusa da boa sorte faz com que os feitos de sua igreja sejam importantes para os mortais de várias raças, estilos de vida e objetivos.
Aqui está, então, uma introdução para algo que começou com um segredo, assunto interno da Igreja de Tymora, e que ainda está influenciando a crença (e todos que buscam os favores da Senhora Sorte) em Faerûn até o momento.
Uma Noite de Visões
Em uma noite não determinada em 1.358 CV, com a Praga Mágica prestes a irromper, o arquisacerdote Baerleglas Thontal, Suplicante Velado (abade) de Tymora na Casa da Chance Justa, abadia de Tymora na zona rural ao noroeste de Crimnor, recebeu uma visão extremamente vívida em seus sonhos.
Ele viu uma espada dançante que arrastava longos e impressionantes fios prateados nos quais moedas lampejavam, brilhavam e desapareciam. A manifestação favorita da deusa, em uma floresta iluminada pela lua. Uma borda da floresta sofria de uma doença estranha, na qual as árvores se retorciam em formatos de pesadelo, com o crescimento de fungos inchados e protuberantes, rasgando suas folhas e despedaçando-se no processo, algumas caindo e morrendo e outras se desfazendo em poeira que era soprada para longe. Esse malogro estava se espalhando com terrível rapidez, e a espada reagia correndo floresta adentro, seu caminho desintegrando árvores em instantes, enquanto avançava. Por quatro vezes, ela se precipitou no bosque, fez uma grande curva e partiu novamente, cortando quatro grandes arcos da floresta. Então pairou, lampejando, e as árvores dentro daqueles arcos começaram a mover-se, arrancando suas raízes do chão e marchando em direção à espada, que as guiava para longe da floresta, em direção à uma distante colina descampada. Por detrás das árvores em marcha, o resto da floresta foi tomado pela praga, e horrivelmente desfigurada e arruinada. Na colina, as árvores pararam enquanto a espada, que era Tymora, voava em um grande elipse ao redor delas, piscava com um brilho ofuscante e desaparecia no centro daquele brilho. A espada deixou para trás uma nova floresta inundada com luar, alta e vigorosa e crescendo… enquanto as árvores doentes, abandonadas, ao longe, se transformavam em sacerdotes Tymoranos, que Thontal conhecia pessoalmente. Seus rostos embasbacados e de olhos mortiços, se amontoavam, conforme caíam, um após o outro.
Assim acabou a visão de Thontal, suando gelado, ao despertar. Ele se levantou, perturbado, vestiu uma túnica e procurou por sua Prefeita (segunda em comando e tesoureira da abadia), a solene e consciente Laurauna Belmantur. Ele a encontrou acordada e em um estado semelhante de temor e consternação, pois ela havia acabado de receber sua própria visão: Esta era sobre si mesma correndo descalça, por uma mata cheia de espinhos e dificultosa, com monstros a atacando por todos os lados, desesperadamente procurando por algo que parecia para ela serem outros clérigos solitários de Tymora em fuga, a luz da deusa em seus rostos. Quando eles a viram, vieram correr ao seu lado. Um grupo de sacerdotes reunidos dessa maneira e correndo por fatigantes quilômetros, até que, enfim, chegaram a uma clareira, onde um facho de luar caía sobre uma espada longa flutuante, com a ponta voltada para baixo, do tamanho de um humano de mais de dois metros de altura, toda feita de moedas em constante movimento: a própria Tymora. Laurauna sentiu uma vontade quase extática de saltar e abraçar a espada e, assim fez, suas pontas a cortavam, mas traziam felicidade, em meio ao fogo divino, que a curava. Sua cabeça, conforme caía para trás, assim como os sacerdotes que estavam com ela dando saltos, estava cheia de uma certeza de que isso estava correto e ela tinha que fazê-lo.
Enquanto Thontal e Belmantur conversavam, foram interrompidos abruptamente pela Preceptora Amanthra Doaloke (líder de adoração, coro e segurança da abadia), Senhora “Mãe” Calathnae Zandarn (líder de ensinamentos e disciplina) e a Senhora Cellarer e a sacristã Imdrarra Halarnhand (líder de assuntos seculares: comida, suprimentos e reparos), todos muito surpresos, pois haviam todos eles recebido visões similares à da Prefeita.
A visão de Doaloke havia sido com a busca da brilhante, porém enterrada espada, que era Tymora em um porão escuro cheio de lâminas enferrujadas, que caíam de um arsenal em ruínas acima. A de Zandarn, de um clero solene vestindo robes, todos encarando um altar de onde a luz dançante de Tymora fluía, tocando-os e transformando todos em monstros horrendos, exceto a si mesma, a luz a protegia e a impulsionava aos ermos em busca de novos e puros adoradores. A de Halarnhand era com dados rolando e moedas quicando sobre uma mesa de mármore branco, esses dados e moedas escureciam e despedaçavam-se, alguns deles transformando-se em cobras cuspideiras e pequenos globos, como mandíbulas batendo, uma forte necessidade crescia em si de arrancar esses dados e moedas do fluxo, sem perder nenhum daqueles que percebia como “verdadeiros”, para serem resgatados desse destino, uma tarefa na qual era lenta demais e logo superada pelos tantos que deixava passar.
Estes cinco clérigos maiores da abadia, conferenciaram em reunião solene até o amanhecer e concordaram entre si, que partiriam dali e, juntos, iriam para um lugar santo nos ermos onde sabiam que Tymora pessoalmente uma vez havia curado um mortal, e lá jejuariam e orariam por orientação. Assim foi feito, e na primeira noite de seu retiro, todos receberam a mesma visão que os colocou no curso das Quatro Missões do Esplendor.
A Primeira Missão
Essa missão foi dada a Laurana Belmantur. A deusa a ordenou a vagar pela área rural das Terras Centrais do Ocidente e recrutar “inocentes” (seres que nunca haviam visitado um templo pleno de qualquer fé, ou se comprometido diante de qualquer deidade) e encontrar indivíduos idôneos, que poderiam “se apegar a Tymora” (tornando-se membros de seu clero). A deusa enviaria a ela visões por meio de sonhos avisando quais de suas escolhas eram genuinamente adequadas, e Laurauna foi encarregada de treinar e guiar espiritualmente esses indicados. Seu trabalho, em seguida, seria ajudar e apoiar esses novos “Ascendentes”, enquanto recrutavam outros para o clero e estabeleciam pequenos santuários, retiros e, por fim, monastérios dedicados a Tymora por toda área rural das Terras Centrais do Ocidente. Estas criações seriam a “nova espinha dorsal da fé”, caso os templos urbanos da deusa fossem arruinados, ou levados à decadência durante “o tumulto agora sobre nós” (a Praga Mágica).
Laurauna trabalhou diligentemente por muito tempo naquilo que lhe foi delegado até sua morte, por febre, nas profundezas frias do inverno que começou em 1.387 CV, e manteve registros de pequenos santuários simples por toda as Terras Centrais do Ocidente. Ela fundou um monastério a alguns dias ao noroeste de Berdusk em 1.362 CV, mas este foi destruído pelo fogo e espadas em um ataque hobgoblin, uma década mais tarde, e sua “espinha dorsal da fé” por volta de 1.480 CV não era mais do que sessenta benzedeiros e sub sacerdotes espalhados pelas Terras Centrais do Ocidente.
A Segunda Missão
Essa missão foi dada a Amanthra Doaloke. A deusa a incumbiu de continuamente recrutar e treinar Campeões de Tymora (visões enviadas pela deusa confirmariam os verdadeiramente adequados e eliminariam os fracos e falsos); líderes aventureiros e carismáticos, que promoveriam a fé e realizariam feitos que seriam louvados e falados, para estimular a plebe geral a uma maior reverência à Senhora Sorte. À medida que esses Campeões gastassem vidas corajosas e preciosas, apostando com sua segurança, a contagem de corpos seria alta e o recrutamento de Amanthra continuaria.
Embora essa missão tenha encontrado sucesso inicialmente, recrutando sacerdotisas aventureiras, tais como Valanthra “Espada Flamejante” Dreth, e Ilvarra Caminho-do-Sol, a maior parte dos recrutas de Amanthra pereceu de maneira espetacular, e logo seu crescente remorso pelas perdas sucessivas fez com que perdesse sua fé em 1.366 CV e assumisse uma confeitaria em Sandrivvur, um pequeno vilarejo ao sudoeste de Priapurl. Ela morreu em sua confeitaria em um incêndio causado por um relâmpago, que destruiu grande parte de Sandrivvur em 1.369 CV.
A Terceira Missão
Essa missão foi dada a Calathnae Zandarn. Tymora a incumbiu de recrutar, treinar e liderar (visões em sonho enviadas pela deusa selecionando os genuinamente dignos e eliminando o resto) um grupo de “Verdadeiros Tymoranos” Estes indivíduos dedicados protegeriam os princípios, tradições e rituais da fé secretamente, habitariam em redutos remotos e se disfarçariam na forma de várias feras inteligentes, para preservar a Igreja de Tymora em caso tudo mais fosse destruído.
Em sua velhice, Calathnae discordou e desafiou a deusa, liderando alguns dos mais jovens e incansáveis Verdadeiros em ataques, para auxiliar abertamente o clero regular sitiado de Tymora, e pereceu (transpassada por seis flechas de milícia) em um desses ataques, no inverno de 1.391 CV. A maioria dos “ativistas” Verdadeiros morreu em várias desventuras, e não se conhece quantos sobreviveram, daqueles que se mantiveram escondidos; apesar de sacerdotes tymoranos tenderem a acreditar que apenas alguns poucos deles estão ainda vivos, suas identidades, localizações, força real e inclinações são de conhecimento apenas de si mesmos e da deusa.
A Quarta Missão
Essa missão foi dada a Imdrarra Halarnhand. A deusa a ordenou a recrutar e auxiliar vários grupos de aventureiros a se tornarem “O Braço Esmagador da Senhora” precipitando-se e frustrando, ou destruindo os inimigos da Igreja de Tymora (e tymoranos em geral), liderando ou até os resgatando quando necessário, para enfraquecer inimigos da deusa e fazer com que todos pensassem duas vezes antes de lançarem-se contra a Igreja de Tymora ou rebaixar o seu poder.
Os esforços de Imdrarra encontraram muito sucesso à princípio, a medida que muitos grupos de aventureiros ganhavam proeminência temporária e veneravam publicamente Tymora. Estes incluíam os Nômades de Amglam, o Escudo Brilhante Selado, os Sete Espadas Partidas de Águas Profundas e os Presas de Javali de Memnon.
Apesar da tênue, sombria e intensa Imdrarra ter sido supostamente assassinada em 1.372 CV, tymoranos dizem que a deusa a reergueu para servir na forma espectral de um espírito sussurrante, portando as palavras da deusa, e alguns “pequenos auxílios” (cura, libertação mágica de prisões e algemas, orientação em terreno traiçoeiro e não familiar) para devotos tymoranos.
Ao longo do tempo, muitos grupos de aventureiros trabalharam pelo seus próprios progressos e enriquecimentos primeiro, e suas orações a Tymora tornaram-se vazias, mas em 1.480 CV, aventureiros jovens e em ascensão tais como o Escudo Ardente de Scornubel e os Exploradores Audazes de Berdusk ainda trabalham com o clero de Tymora e louvam publicamente a deusa.
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Ed Greenwood é o homem que lançou o cenário de Forgotten Realms, os Reinos Esquecidos, em um mundo vivo. Ele trabalha em bibliotecas, e escreve histórias sobre fantasia, ciência, ficção, terror, mistério e romance (algumas vezes tudo isso em um mesmo livro), mas fica feliz quando produz Conhecimento dos Reinos, Conhecimento dos Reinos e mais Conhecimento dos Reinos. Ele ainda tem algum espaço vago em quartos de sua casa, usados para empilhar papéis.
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