Como dar um Up na Sua Campanha Usando Prelúdios
por Christian Zeuch
Imagem destacada, “The Journey”, de Atna Joy, disponível em https://www.artstation.com/artwork/Q2orr
Como um breve contexto, eu havia decidido mestrar “Curse of Strahd” (CoS), ou “Maldição de Strahd“, para meu grupo, assim que terminasse a campanha que jogávamos na época. Não havia lhes dito que jogaríamos CoS especificamente, porém um dos meus jogadores sugeriu fazer uma sessão inicial de prelúdio. Achei a ideia interessante, mas pouco viável: todos ao redor de uma mesa, criando suas histórias, sendo que é uma coisa individual.
Então me veio uma ideia com base na sugestão do meu jogador: prelúdio via Whatsapp! Mas antes de entrar no assunto, vamos à definição de “prelúdio“:
“Ato preliminar, primeiro passo para; ato preliminar, primeiro passo para”
Explicarei em breve o que é, em termos de RPG, e como executar, mas quero primeiro ressaltar os benefícios que a execução desses prelúdios trouxe ao grupo:
- Jogadores conhecem seus PJs à fundo
- Jogadores criam uma forte conexão com seus PJs antes mesmo da campanha começar
- Mestre conhece melhor os PJs antes de começar a campanha
- Mestre conhece melhor os jogadores, sua maneira de pensar e agir
- Mestre pode envolver os PJs na história da campanha
ou
- Mestre pode mais facilmente criar uma campanha em volta dos PJs
- Diversão pré-campanha
- Jogadores ficam mais empolgados com a campanha
- Melhora o enredo e aumenta a imersão
Até o momento, vi apenas quatro desvantagens dos prelúdios:
- Toma um certo tempo (2 a 3 meses) para narrar
- Mestre precisa criar/improvisar 4 a 6 mini-campanhas
- Dependendo dos jogadores e de seus PJs, conflitos internos podem ocorrer pelos jogadores encarnarem seus PJs a fio
- Pode trazer desmotivação à campanha atual, devido ao hype da campanha futura, do prelúdio
Muito bem, sem mais delongas, o que é um prelúdio no RPG, e como fazer. Vou trazer exemplos da minha experiência com os seis prelúdios que rodei com meus seis jogadores, durante cerca de três meses, e de seus “crossovers”.
O que é um Prelúdio?
Em resumo, é você, Mestre, construindo a história dos PJs dos seus jogadores junto com os mesmos, porém individualmente, com cada um deles, através de algum aplicativo de texto (Whatsapp, Telegram). Você pode encarar o prelúdio como uma pré-campanha para cada um dos PJs, onde eles serão colocados em diversas situações, refletirão sobres as mesmas e, aos poucos, o PJ começa a ser “impresso” na mente do jogador.
Como executar um Prelúdio?
Para rodar os prelúdios, você e seus jogadores precisarão do Whatsapp ou Telegram e, preferencialmente, de um app para rolar dados via texto. O Telegram tem bot integrado, e no Whats pode ser usado o Dragon Dice. Nele você rola o dado, e envia o resultado via Whats. O mestre pode conferir o resultado no seu app, se necessário, já que o app guarda um log das rolagens dos usuários.
Inicialmente, escolha um jogador para começar. O melhor é fazer um por vez, no máximo dois. Caso você tenha jogadores que demoram a interagir ou responder, pode começar com um terceiro jogador. Mas nunca passe disso, ou você terá uma grande confusão para gerenciar.
Peça ao jogador um ou dois parágrafos sobre linhas gerais de como ele gostaria que fosse seu PJ, sua história. Esta será a base para iniciar o prelúdio com aquele jogador.
Crie um grupo no Whats, só você e ele. Use o grupo para narrar e interagir com o PJ. Use Itálico para diálogos, para facilitar a identificação de um PdM falando. Use negrito para perguntas que requerem uma ação do jogador.
Baseado na história providenciada pelo jogador (um a dois parágrafos), elabore o início da vida do PJ. Se o jogador não detalhou algo, sinta-se à vontade para criar ou se tiver dúvida, pergunte se o jogador concorda com algo. No meu caso, eu perguntei se um dos jogadores se importava de ser órfão, e ele aceitou. Narre os acontecimentos até algum ponto na infância. Você decide a idade, mas de preferência que seja algo que o PJ possa lembrar, então recomendo que seja no mínimo com cinco e seis anos. Coloque-o em uma situação simples, e pergunte como ele se sente naquele momento. Por exemplo, seu pai lhe ensinou a empunhar uma espada de treinamento pela primeira vez. Como seu PJ se sentiu? Ao final do artigo, haverá uma pequena lista de exemplos de situações reais e das perguntas que fiz na época.
Depois, avance um pouco no tempo, narre mais alguns detalhes de sua vida, da interação do PJ com alguns PdMs importantes na vida dele naquele momento. Em certo ponto, coloque o PJ em alguma situação moral ou ética para ajudar o PJ a definir sua personalidade e tendência. Por exemplo, coloque o PJ para presenciar uma situação de bullying na escola, ou ser testemunha de um ato de violência. Pergunte a ele qual sua ação, e depois de tomada a ação, qual o sentimento dele com relação àquilo. Isso vai ajudar o jogador a saber como o PJ dele funciona.
Passada a adolescência, comece a encaminhar o PJ para o seu destino como aventureiro. Ele será um guerreiro? Já estará treinando para tal. Narre isto para ele. Ao chegar à idade de um jovem adulto, o PJ já estará com aptidões mínimas para realizar pequenas missões relevantes, onde o jogador pode continuar definindo a personalidade e motivação do seu PJ.
Nesta etapa, já comece a pensar em missões ou situações que estejam relacionadas com a campanha, seja ela sua, ou uma campanha pronta, como no meu caso com CoS. Um dos ganchos de CoS é relacionado com ataques de lobisomens próximo de Vau da Adaga. Alguns dos prelúdios que narrei foram naquela aldeia, e eu coloquei dois dos meus jogadores em uma missão para investigar esse ataques. Aqui, fiz um “crossover“, que eu explicarei mais tarde.
À partir daí, é só seguir a lógica de conectar narração, com situação ou missões, que leve o PJ cada vez mais perto do destino final: o início da campanha. Lembre-se de sempre perguntar como ele quer agir, como se sente com aquilo, etc.
Nestas situações ou missões, você tem duas opções:
1 – Narração:
Você não usa rolagem de dados e define o resultado baseado na descrição da ação do jogador. Dessa forma, não há necessidade de rolar dados se considerar que é um prelúdio, onde tudo já aconteceu. Porém, pode parecer que você está fazendo as coisas como quer, e o jogador pode não gostar. Em combates, fica muito mais envolvente e divertido. Esqueça as regras! Use sua imaginação, e o jogador a dele.
2 – Rolagem:
Use apps para rolagem de dados para definir alguns resultados. Assim, vai parecer que o jogador tem chance de mudar seu destino, porém tem essa burocracia a mais de ficar abrindo app e compartilhando resultados.
Crossovers
Um crossover é quando dois personagens ou histórias se juntam em uma, tipo no seriado “The Flash” e “Arrow“, onde o Barry conversa com Oliver nos capítulos de “The Flash“, por exemplo. Use os crossover apenas se você quer que o grupo já comece a campanha como um grupo. Caso queira juntar eles na primeira sessão, pule esta parte.
O crossover nada mais é que juntar PJs durante o prelúdio. Pode ser feito de forma direta, ou indiretamente. Lembram quando comentei da missão dos lobisomens na qual eu coloquei dois jogadores? Eu narrei a mesma missão para ambos os jogadores, em seus prelúdios individuais, sem eles saberem que um dos PdMs da missão seria, no futuro, um colega aventureiro!
Nos demais casos, eu fiz isso de forma direta. Por exemplo, queria juntar o bárbaro e o clérigo que tinham uma PdM súcubo em comum. O clérigo se refugiou em uma caverna devido a uma forte tempestade, e foi gravemente ferido por um urso, desmaiando. O bárbaro estava passando por perto, ouviu a comoção, e foi até lá. Ele finalizou o urso e ajudou o anão. Nesse momento, eu criei um novo grupo de Whats com os dois jogadores e a reação deles foi “WTF!”. Dali em diante, passei a narrar nesse grupo já que estavam juntos. Se quiserem fazer algo individual, só voltar para o grupo do prelúdio individual.
Exemplos de Situações e Perguntas
Raghar e outros 2 amigos, o Layzzy e o Teruath, vão até o homem. Ele veste roupas muito bonitas, com detalhes em dourado, e de baixo podem ver uma bolsa de couro que parece estar cheia de dinheiro. Quando ele vê vocês, se aproximando, ele olha para as crianças com um olhar que mais tarde Raghar veio a descobrir que aquele olhar que lhe marcou era o de indiferença e desgosto. Ele começou a se afastar das crianças enquanto acelerava o passo.
Como Raghar se sentiu diante dessa situação e o que ele faz?
Gannhor diz: “Estão havendo alguns relatos de ataques de lobisomem em vilarejos ao sul daqui. Vocês devem ir até Masthof e averiguar a situação. Um aprendiz vai acompanhar vocês para auxiliar na investigação. Providenciamos lanças com ponta de prata, caso o pior aconteça. Não sabemos se a informação procede ou não, mas melhor estar preparado. Partam imediatamente”.
Como você te sente diante à primeira tarefa fora da cidade?
Certo dia, quando Yeghel tinha seus 7 anos de idade, o pai dele o jogou de um precipício e o forçou a se virar, sobreviver. Sua mãe ficou horrizada, Yeghel pôde ver, antes de cair, a face dela ficando pálida, seus olhos se arregalando, mas ela ficou calada, parada como uma estátua.
Como Yeghel se sentiu quando seu próprio pai o arremessou para a morte, mesmo sabendo que era parte do treinamento, para lhe fortalecer?
Além disso, como Yeghel se sente com relação ao seu pai? E à sua mãe?
Outras Situações
Abaixo há também exemplos de situações que os PJs passaram antes mesmo de começar a campanha.
- O bárbaro foi preso pelo pai, e teve que enfrentar dois lobos com as próprias mãos
- O clérigo foi dominado por um súcubo e abriu uma passagem para duergares invadiram os Salões de Mitral
- O bruxo explorou a Floresta das Brumas com dois guardas e enfrentaram cinco lobos
- O paladino caçou vários bandidos que tinham prêmios sobre suas cabeças
- O mago recebeu uma palestra de uma do próprio Elminster na Escola Arcana em que estudava (o dono era um velho amigo do Escolhido de Mystra)
- O bárbaro e o clérigo investigaram e acabaram com uma casa de jogo que usava magia para alterar os resultados ao seu favor, e com isso conseguiram um livro para entrar no Forte da Vela
- O paladino recebeu seus poderes e missão de Lendys em pessoa, para executar sua justiça entre os homens, já que Tyr estava falhando, em sua visão
- O paladino recebeu um ovo de um dragão de latão, que se tornou sua companheira, sua filha, praticamente
- O bruxo entrou para os Harpistas, onde aprendeu a usar informações e ligar os pontos para, enfim, chegar um pouco mais perto do mistério que foi o desaparecimento de seus pais
- O grupo todo foi reunido e mapeou toda a Floresta das Brumas durante um ano
Esses são os prelúdios, recomendo muito, fica muito legal o resultado final! Qualquer dúvida, só entrar em contato para mais detalhes se quiserem!