Capítulo 13 – O Pântano de Tun
por Ricardo Costa
Imagem destacada criada por IA (Crayon)
Dedicado ao leitor Rildo Lúcio
O dia havia acabado de raiar no Entreposto do Chifre Alto. O frio do inverno era potencializado pela altitude e gerava uma névoa branca e densa que cobria o topo liso e plano daquela montanha, onde o Reino de Cormyr havia instalado o entreposto comercial, lugar pouco maior do que um bairro. Ainda que a maioria das pessoas ali ainda estivesse acordando, os integrantes da Comitiva da Fé já estavam prontos e em movimento: haviam montado os cavalos, retirado a carroça do estábulo geral e começavam a descer a estrada, escavada na montanha tal qual uma serpente enroscada no tronco de uma árvore. Iam em direção aos imensõs portões que divisavam Cormyr das Terras Centrais Ocidentais, caminho necessário para prosseguirem à distante Portal de Baldur. Desta vez, não cruzaram com soldados do Zentharim ou com ninguém. A descida foi solitária e tranquila.
Logo ao descer, saíram da estrada secundária do entreposto e rumaram para ao caminho principal, espremido entre colossais paredões rochosos. Do lado de dentro da carroça, estavam Fibin e Baruk. O pequenino ruivo e sardento estava com a pequena caixa de madeira, deixada na mesa da taverna do entreposto, pelo misterioso homem de barbas brancas que apresentou-se como Godric. A curiosidade o dominava completamente. Ainda que os pequeninos fossem naturalmente curiosos, Fibin estava acima da média nessa matéria. Queria abrir a caixa, mas os outros haviam decidido esperar até encontrarem um local seguro.
— Guarda essa caixa, pequenino! — aconselhou Baruk.
—Você não está curioso para saber o que tem dentro?
— Não. E vai que tem uma armadilha? Já lhe disse…guarde esse negócio — insisttu o anão.
— Já vi a caixa de todos os angulos, chacoalhei e tudo. Não parece ter nenhum mecanismo… mas vou guardar, senão os…
Fibin não completou a frase. Foi interrompido por um solavanco provocado por um buraco na estrada. A caixa de madeira escorregou de suas mãos e caiu no assoalho de madeira da carroça, e a tampa se abriu. Baruk acenou negativamente com a cabeça.
— Não fui eu, hein!? — disse, desconcertado, para em seguida, prestar atenção na caixa aberta.
Havia dentro dela 3 pequenas garrafinhas, uma delas escapuliu da caixa durante o tombo. Continha um líquido vermelho claro, levemente cintilante. Havia outra coisa caída, um colar com um pingente, ambos feitos de prata. Fibin realocou a garrafinha extraviada em seu compartimento na caixa e pegou o colar. O ergueu pela corrente à altura dos olhos para observar o pingente. Era uma harpa.
— Você disse que o tal Godric era músico e tocava harpa… — lembrou Fibin
— Agora vejo que ele é mais do que isso… — o anão agora estava mais curioso do que o pequenino, e aproximou o seu rosto do pingente também. — Ele é um Harpista!
— É claro! Se toca harpa, é um harpista! — concluiu Fibin.
— Não, seu tolo! Os Harpistas são um grupo de pessoas que agem em um tipo de rede, para combater os tiranos, os magos enlouquecidos e evitar o mal, coisas assim! Nosso amigo Kariel tem um colar e um pingente bem parecido com esse! É uma informação para partilharmos com nossos amigos lá fora! Agora, em nome de Moradin, guarde esse colar e feche essa caixa de uma vez!
Do lado de fora, Limiekki e Bingo conduziam a carroça, sendo escoltados por Magnus e Arthos. Estavam se aproximando dos imensos portões, cujas folhas, de tão altas e pesadas, certamente, só poderiam ser abertas completamente com a força de gigantes ou através de magia. Uma guarnição de cerca de vinte soldados, a maioria dragões negros de Cormyr e uns poucos soldados Zentharim estavam à frente de um portão menor, aberto em uma das gigantescas portas. Ao se aproximarem, um oficial pediu a documentação à Limiekki, que retirou do tubo de bambu o papel assinado pelo despachante real Bravo Javar. O soldado olhou rapidamente o odcumento e deu autorização para prosseguirem e assim deixaram para trás as terras cormyrianas, oferecendo um certo alívio para os integrantes da Comitiva da Fé.
Passou-se mais ou menos meia hora e a estrada se afunilava aos poucos em um vale estreito, quando um ruído de algo desabando pode ser ouvido a frente. Um tronco havia caido de algum ponto mais alto, obstruindo parcialmente o caminho. Arthos e Magnus, de seus cavalos, olharam ao redor. Viram homens saírem rapidamente de um esconderijo entre as rochas e virem em sua direção. Eram cerca de vinte homens e era possível ver que estavam em armadura de couro e brandiam espadas e machados!
— Uma emboscada! Preparem-se! — bradou o paladino de Helm, retirando sua espada.
E assim fizeram todos da Comitiva. Mesmo Baruk, que estava dentro da carroça, tomou seu machado e com um sorriso pulou do vagão para o chão – “Fique aí, Fibin! Toma conta da carga!”.
— Salve! Sou Vandal! Fiquei sabendo que tem um carregamento de vinhos aí dentro! Para passar por aqui vocês tem que deixar um pedágio para o Clã dos Lagartos Negros! Nos contentamos com um terço!
— Se não dermos a vocês, que vão fazer? — perguntou Arthos!
O homem sorriu.
— Somos vinte e vocês cinco, pelo que pude contar! Se não nos derem, vamos matar vocês e ficar com toda a carga. Estou achando que talvez essa seja a melhor opção! – o bandido riu novamente, acompanhado de alguns de seus comparsas!
— Olha…vamos lhe dar uma terceira opção! – disse Limiekki
O guardião, rápido como um relâmpago, retirou de trás de si um arco e disparou duas flechas certeiras, derrubando de pronto, dois bandidos ao chão. Magnus e Arthos desmontaram rapidamente de seus cavalos e foram em direção aos oponentes mais próximos e Baruk correu, gritando e sorrindo, com o machado nas mãos. A batalha teve início!
A luta teria sido vantajosa para o Clã dos Lagartos Negros, se estivessem escolhido como adversários uma escolta comum. Tiveram azar! Seus oponentes faziam parte de um dos mais experimentados grupos de aventureiros de Faerûn e Vandal viu seus homens caírem como moscas, em uma impressionante velocidade. Dezoito eram seus homens, logo eram quinze, de quinze foram a dez, de dez para oito…
— Fujam! Fujam! — gritou, em desespero o chefe dos bandidos, ele próprio correndo o mais rápido que pode de volta direção às montanhas. Bingo ainda ia disparar algumas flechas, mas Limiekki lhe disse para economizá-las.
— Esses caras não voltam aqui tão cedo, Bingo!
Os aventureiros iam guardando suas armas, quando ouviram…palmas! De uma pedra, viram um idoso sorridente! Godric era o seu nome!
— Sim! Parabéns! Eu sabia que não poderia estar enganado! É a Comitiva da Fé! Mas como isso é possível? Me disseram que estavam mortos há muito tempo!
Os aventureiros se entreolharam. Limiekki ainda tentou disfarçar!
— Deve estar nos confundindo, meu senhor!
— Não…estive em uma reunião dos Harpistas, na estalagem do Velho Crânio, no Vale das Sombras. Eu vi você, jovem Magnus, assim como este pequenino Bingo e o elfo mago de cabelos azuis! Tinha cerca de trinta anos na época…mas sou conhecido por nunca esquecer de um rosto!
— Você é um Harpista? — perguntou Magnus.
— Ele é um Harpista! — respondeu Fibin, que saiu do vagão da carroça com a caixa de madeira em uma das mãos e o colar de prata na outra!
— Vejo que abriram a caixa! Ela contém três poções de cura. Essas vocês podem ficar…estou velho demais para entrar em masmorras e lutar com espada. Serão mais úteis para vocês. Mas o colar eu quero de volta! — Godric aproximou-se de Fibin, que lhe entregou a jóia. Godric o colocou no pescoço. — Agora acho que podemos falar um pouco de verdades! Por Mystra, como estão assim tão jovens? Não parecem um dia mais velhos desde que vi vocês!
Magnus pensou que os disfarces agora eram inúteis e decidiu confiar no Harpista.
— Em resumo, viemos através de uma magia capaz de manipular o tempo, do ano de 1.373. Fomos trazidos aqui para ajudar a deter o Zentharim e para isto temos que levar esta carroça em segurança para Portal de Baldur.
— Será que os Harpistas podem nos ajudar? – perguntou Arthos.
— Lamento. Os Harpistas que existem hoje são poucos e muitos se ocultam como podem para escapar do Zentharim. Durante o grande expurgo de 1.374, todos os grandes Harpistas desapareceram, Os demais, foram perseguidos e mortos ao longo dos anos. – disse, tristonho Godric — No, entanto, meus amigos, se não se encomodarem, esse velho Harpista ainda pode contribuir de alguma forma. E será uma honra estar ao lado da Comitiva da Fé.
— Então, Godric…pode subir e vamos conosco! — disse Limiekki, oferecendo a mão para que o homem se juntasse a ele e Bingo no banco do condutor. — Estamos rumando para Asbravn!
— Excelente. Tenho um irmão em Asbravn. O nome dele é Godwin. Ele tem uma loja Cavalo de Ferro. Ele tem alguns contatos e pode nos ajudar.
Magnus e Arthos removeram os corpos dos bandidos, bem como o tronco que havia sido derrubado por eles na estrada e prosseguiram a viagem.
O Pantano de Tûn
A estrada rumo ao Oeste finalmente deixou a escolta dos altos montes dos Picos das Tempestades e começou a margear uma terra pantanosa. O piso pedregoso deu lugar a uma areia molhada, por vezes elemeada, que atrasava o avanço da caravana. Havia uma vegetação de troncos finos e retorcidos, com poucas ou quase nenhuma folhas. As águas dos agora constantes charcos eram verdes leitosas, bastante mal cheirosas, e haviam pedras naturais e outras que pareciam antigos pilares e desgastados tijolos, de alguma muralha, destruída a muitas eras atrás. Não era, definitivamente, um lugar tranquilizador, ainda mais agora, cuja tarde declarava a proximidade da noite e de seus temores. Godric então falou para Limiekki e Bingo, seus companheiros do assento de condutor da carroça.
— O Pantâno de Tún não é um lugar interessante para passarmos sem abrigo. Além dos mosquitos existem stirges e relatos mesmo que um dragão negro chamado Skurge vive nesses lados. Se não bastasse, dizem que o pantâno foi criado pela guerra de dois reinos esquecidos pelo tempo e que almas dos mortos podem assombrar à noite.
— Yondalla! — exclamou, Bingo — Não temos como passar direto, não?
— Não há tempo, pequenino! A noite cai em breve! — respondeu o veterano Harpista — Sugiro pararmos aqui e formamos uma dupla de batedores com os cavalos em busca de um abrigo para passar a noite. Essas montanhas possuem cavernas e, se dermos sorte, encontramos alguma! Me ofereço para ir nesse reconhecimento de terreno.
A ideia foi acatada pelos aventureiros e foi o paladino Magnus o escolhido para formar a dupla com Godric e foram com os cavalos à frente, deixando os demais em prontidão.
Os Batedores
Magnus e Godric cavalgaram às margens pantanosas, próximas as escarpas das montanhas durante quarenta minutos, mas não haviam encontrado nada que pudesse ser um abrigo adequado. Notaram que os cavalos estavam se tornando arredios a prosseguir e decidiram amarrá-los em um tronco, em um local de terreno seco, e prosseguir a pé por mais alguns minutos. Se nada encontrassem, voltariam e teriam que enfrentar a noite naquele lugar sinistro, sem nenhuma proteção efetiva.
A medida que andavam, com a dificuldade que era caminhar nos charcos, Magnus e Godric observavam muitos pedaços grandes de um cristal semi-transparente, grosso e desgastado, e algumas pedras com ornamentos antigos e partes quebradas de estátuas. Repentinamente, ao pisar em uma área mais encharcada, algo se enroscou ao pé direito de Magnus, que sacou sua espada imediatamente. Mas não era um animal ou monstro, mas a tira de uma sacola de couro, muito antiga. Magnus puxou-a do solo e ao toca-la, a fivela se abriu. O jovem paladino olhou o conteúdo: Havia um pequeno livreto, tal qual um diário de mão, e uma mascara em forma de face, completamente feita de cristal. Ambos estavam secos e conservados, o que era impressionante para o local onde estavam. Ele mostrou o achado para Godric.
— Muito interessante! Deve ser um resquício da civilização que existia aqui! Será bom pesquisarmos isto, assim que for possível! Guarde consigo, Magnus! Vamos continuar!
Prosseguiram observando atentamente as paredes rochosas. Quando estavam próximos a desistir e retornar, encontraram, enfim, uma caverna. Se aproximaram e viram que ela era seca, de piso plano e com espaço suficiente até mesmo para abrigar os cavalos.
— Acho melhor darmos uma olhada para ver se está tudo limpo aqui! — disse Magnus.
— Sim…é prudente! – respondeu Godric.
Retiraram ambos tochas das mochilas e as acenderam com as perdeneiras e foram caverna a dentro. A câmara era extensa, mas parecia se afunilar a medida que avançavam. Das sombras, ouviu-se um barulho de rochas se soltando e um rugido. Uma criatura humanóide monstruosa e agigantada, de pele verde, nariz e queixo pronunciados e braços finos e compridos encerrados em unhas negras, pontiagudas como adagas, saltou na direção de Magnus, que deixou cair a tocha. Em continuidade, golpeou o paladino, que foi empurrado para as pedras. Magnus se refez do empurrão, sacou a espada e devolveu o golpe, atingindo o flanco da criatura.
— Um troll! — bradou Godric.
O monstro voltou então sua atenção para o Harpista, que retirou um frasco de bojo arredondado de seu cinto e o arremessou. O vidro partiu-se sobre a criatura e imediatamente incendiou. O troll urrou terrivelmente e, em chamas, atingiu fortemente Godric, que foi arremessado em um parede de pedra. Nesse momento, a lâmina da espada de Magnus atravessou as costas da criatura, saindo em seu ventre. O monstro caiu, em chamas, e morto.
Magnus correu na direção de Godric. O idoso sangrava abundantemente: as garras rasgaram-lhe a barriga.
— Godric!
— Foi uma honra, paladino! Você é uma lenda no Vale das Sombras! – disse o homem, ciente de que seu tempo estava chegando ao fim, pouco antes de fechar os olhos.
— Não ainda! — disse Magnus, largando sua espada ao solo e estendendo suas mãos sobre ferimento, orando pelo poder curativo de Helm.
Mas, por uma questão de segundos, Godric estava além de qualquer cura, divina ou mundana. Magnus baixou a cabeça, triste por não poder ajudar o veterano e fez uma oração:
Helm! Receba em seus braços protetores o companheiro Godric,
E o conduza o descanso eterno em sua presença ao lado dos deuses.
Que sua alma encontre paz e conforto em sua morada celestial,
E que seu espírito continue a servir em seus domínios sagrados.
Em seguida, o paladino carregou o corpo do Harpista para fora da caverna e o cobriu de pedras. Arrastou também o troll morto, mas este, empurrou raivosamente em um poço de lama.
No entanto, a tarde estava caindo, e Magnus pôs-se a retornar ao encontro dos seus colegas.
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Como é bom ler novamente uma resenha da Comitiva da Fé!!!
Espero ansiosamente a continuação, uma vez que de tão bom acabou tão rapido a leitura!!!